Carta Aberta ao Dr. Salazar – Um Documento Inédito, de Henrique Galvão. 1.ª Edição. 136 pp. 1975. Editora Arcádia.
Limito-me a chamar a atenção dos portugueses para o extraordinário documento que vão ler: a melhor autópsia do ditador que nos ia perdendo. Henrique Galvão, além do mais, foi sempre um grande escritor, mas nunca se revelou um epistológrafo. Aqui o têm e de que maneira.
Não se trata só da encapelização do taumaturgo de Santa Comba Dão, ou melhor aquilo a que Galvão chamava o «cornaca» de Santa Comba, que durante décadas procurou perverter o carácter português como se nós fossemos um país de camelos. O que esta carta contém é, sobretudo, a definição dum estilo de vida, misto de falso misticismo e de apego feroz ao poder discricionário. Quem tiver o privilégio das nossas amarguras, a passividade de muitos e a heroica inconformidade dos quais jamais actualizaram o carácter.
E entre estes a figura de Henrique Galvão emerge corajosa e causticante, nobre exemplo de valentia, como se de um D. Quixote se tratasse, esgrimindo contra os moinhos da perfídia e da maldade. Por isso, leitor amigo, prepara-te para uma caminhada dramática em que se não perdeu tudo. O caminheiro das picadas, o escritor e o político surgem nesta carta com altura e um desassombro que devem merecer o respeito mesmo daqueles que não estejam de acordo.
É um documento viril dum prisioneiro que defronta, sem medo, o seu tenebroso carcereiro. Durante cerca de seis anos apreciei Henrique Galvão, e sobre ele, com mais detalhes, me pronunciarei oportunamente.
Nada mais.
O leitor que se mentalize para avaliar a grandeza deste extraordinário testemunho.
Vasco da Gama Fernandes
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